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Estudo do Instituto Mondó que revela ligação entre depressão e violência sexual entre adolescentes do Marajó é apresentado em Portugal

Assessoria de Imprensa 09/06/2025

Uma pesquisa realizada com mais de 200 adolescentes em Breves, no arquipélago do Marajó (PA), em 2024, revelou uma dura realidade: a violência sexual e física está associada ao sofrimento emocional e a sintomas de depressão entre os jovens da região.

O estudo, coordenado por Rodrigo Arruda, do Núcleo de Impacto do Instituto Mondó, embasou um artigo científico que foi apresentado durante a III Conferência Internacional de Políticas Públicas e Ciências dos Dados, realizada de 19 a 21 de maio deste ano, na Universidade de Aveiro, em Portugal.

A pesquisa traçou o perfil de adolescentes com idade média de 13,8 anos (variando entre 11 e 20 anos), revelando um recorte diverso em termos de identidade de gênero — 50,5% se identificam como meninos, 47,3% como meninas e 2,2% com outras identidades. Quanto à cor/raça, 67% se autodeclaram pardos, 16% pretos e 12% brancos.

No que diz respeito ao local de residência, 52% vivem em áreas urbanas, enquanto 28% estão em comunidades ribeirinhas. As condições de vida também foram mapeadas: em média, seis pessoas dividem a mesma casa, e 22% enfrentam insegurança alimentar.

Os dados gerados pela pesquisa foram essenciais para a criação do PROA – Programa de Orientação e Acolhimento, uma iniciativa do Instituto Mondó que capacita profissionais das escolas públicas para atuarem na promoção da saúde mental e no enfrentamento da violência nas comunidades atendidas, com ações desenvolvidas a partir das escolas municipais.

O programa está sendo executado em parceria com a Fundação José Luiz Setúbal, com prazo inicial de três anos.

COLETA DE DADOS

“Parte essencial do projeto, que é o diagnóstico, foi elaborada com a coleta de informações obtidas por meio de entrevistas com estudantes da rede pública de ensino, o principal público-alvo do programa. Eles nos apresentaram a uma realidade preocupante: a média do score de depressão entre adolescentes que sofreram agressão foi de 10,31 (classificada como moderada), enquanto os que não sofreram tiveram média de 5,97 (tida como depressão leve) — uma diferença estatisticamente significante”, explica Rodrigo Arruda.

Os números apresentados por Rodrigo se respaldam na ferramenta PHQ-9 (Patient Health Questionnaire-9), que é amplamente utilizada por profissionais de saúde, como médicos e psicólogos para avaliar a presença e gravidade dos sintomas de depressão com base nos critérios do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM).

O PHQ-9 apresenta nove questões cujas respostas, depois de somadas, indicam o grau de depressão em uma escala que vai de 0 a 27.

Nesse cenário, o diagnóstico apontou que 62,8% dos adolescentes sofriam algum grau de depressão, da leve (30,4% dos jovens), moderada (16,2%), moderadamente grave (12%) até a depressão grave (em 4,2%). Além disso, os dados expõem ainda que 14,4% dos jovens relataram ter sofrido assédio sexual e 17,8% foram alvo de racismo.

Quase 60% dos adolescentes afirmou, ainda, que ter vivenciado eventos climáticos extremos, como secas e enchentes, afetou diretamente a saúde mental deles.

Carolina Maciel, diretora executiva, e Rodrigo Arruda, coordenador do Núcleo de Impacto da Rede Mondó na Universidade de Aveiros, Portugal, onde apresentaram o estudo | Foto: Arquivo Pessoal

COMBATE À EXPLORAÇÃO SEXUAL

“Esses achados confirmam que experiências de violência física e sexual não apenas aumentam o risco de sofrimento emocional, mas também revelam a urgência de políticas públicas voltadas à prevenção da violência e ao cuidado com a saúde mental de adolescentes, especialmente em regiões marcadas por vulnerabilidade social, como o arquipélago do Marajó”, ressalta Rodrigo.

Um dos espaços para identificar e acolher os jovens é, justamente, a escola, conforme explica a psicóloga Camila Souza, que integra o Instituto Mondó. “Crianças e adolescentes compartilham muito das suas experiências de vida no cotidiano das aulas. O PROA age diretamente para que o ambiente escolar possa ser uma referência para esses meninos e meninas se sentirem seguros e protegidos”, explica.

O projeto vem atuando em escolas públicas de Breves, capacitando, desde o início de 2025, cerca de 160 profissionais da educação, saúde e assistência social, criando uma rede de escuta qualificada. Esse trabalho está sendo realizado em parceria com a Associação pela Saúde Emocional (ASEC+).

Segundo Camila, apesar de existirem serviços como o CAPS e o Hospital Regional, a demanda por atendimento psicológico em Breves é muito maior do que a capacidade instalada – por isso, há a necessidade de ampliar a rede de profissionais qualificados.

CONSELHOS

Embora o foco inicial do Instituto Mondó seja o desenvolvimento territorial a partir da escola, os altos índices de suicídio e automutilação entre crianças e adolescentes revelaram uma correlação direta com a violência sexual, tornando o combate a esse tipo de violência uma prioridade da organização.

“No Marajó, onde a vulnerabilidade das famílias é profunda, não é possível promover educação sem garantir proteção. Combater a exploração sexual infantil se tornou, assim, parte inseparável do compromisso do Instituto Mondó com o futuro das crianças e adolescentes da região”, destaca Júlia Jungmann, diretora de relações institucionais do Instituto.

Por isso, antes de desenvolver o PROA, o Instituto Mondó já participava ativamente de instâncias como o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, o Comitê de Gestão Colegiada da Rede de Proteção Social de Crianças e Adolescentes Vítimas ou Testemunhas de Violência, e a REPI – Rede Estadual da Primeira Infância.

DADOS COMO FERRAMENTA

Referência no combate à exploração sexual infantil na Amazônia, irmã Marie Henriqueta Cavalcante, do Instituto Dom Azcona, parceiro do Mondó, acredita os dados produzidos são fundamentais para desconstruir estigmas históricos que pesam sobre o Marajó e para construir políticas públicas realmente eficazes.

“Lamentavelmente, uma das grandes cobranças que eu faço é termos dados qualificados e quantificados. Essa questão dos estigmas é histórica e as pessoas os usam como justificativa para a manutenção do crime. Se não avançarmos nas políticas públicas, não vamos superar essa questão de maneira nenhuma”, afirma.

Henriqueta defende a articulação entre organizações como estratégia fundamental para romper com o ciclo de projetos pontuais e resultados frágeis. “A forma como nós podemos superar isso é unindo forças. Trabalhar de forma isolada não adianta. É preciso que as organizações e projetos sociais que atuam no Marajó se articulem de maneira permanente”, reforça.

POLÍTICAS PÚBLICAS

Ao ser apresentado em uma conferência internacional, o diagnóstico desenvolvido do Instituto Mondó coloca a realidade do Marajó no centro de debates globais sobre saúde mental, políticas públicas e desenvolvimento sustentável. Segundo Rodrigo Arruda, a proposta é abrir portas para novos estudos e colaborações internacionais que tragam impactos concretos à vida de crianças e adolescentes marajoaras.

“O Instituto Mondó tem se dedicado a entender profundamente o território e as realidades vividas pelas famílias em Marajó, o que confere uma perspectiva única e significativa para os debates globais. Esse conhecimento é essencial para construir políticas adequadas à realidade local”, afirma.

Em ano de preparação para a COP30, que será realizada em Belém, o trabalho do Instituto Mondó se torna ainda mais relevante como exemplo de atuação territorial comprometida, que alia conhecimento técnico, sensibilidade social e articulação política para transformar realidades historicamente invisibilizadas.

Assessoria de Imprensa/ Maré Comunicação

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